sexta-feira, 3 de junho de 2016

Alegria em meio a dor

Hoje vou falar de algo incrível que me aconteceu durante esses longos e tenebrosos 10 meses. Na verdade somaram-se mais alguns meses ao total, pois após o diagnóstico dizimante da reumatologista, permaneci no mesmo estado enquanto meu marido procurava alguma outra alternativa para o meu caso. Foram, no total, 1 ano de reclusão e dores.

Quando olho para aquele tempo, não consigo entender como não enlouqueci. Bom, na verdade consigo... Tenho um Deus que cuida de mim. Ele manteve minha sanidade e fez com que eu vivesse um dia de cada vez. Sim, para cada dia em que eu acordava, eram 24 horas a serem vividas, sem somar com as passadas. Se, por alguns instantes, olhasse para trás e pensasse "estou assim há tanto tempo", enlouqueceria.

Meu quarto tinha 3 portas: uma de entrada, uma para a suite e uma para a varanda. Costumo dizer que esta porta para a varanda era minha companheira. Deitada por horas em minha cama, olhava para aquela porta aberta, olhava para o céu, ouvia as pessoas que estavam na rua, os carros, os animais miando, latindo, assoviando. A vida de lá de fora entrava pelo meu quarto e por mais que eu pudesse me sentir sozinha, não me sentia.

As redes sociais e aplicativos me mantinham em atividade. Através do computador ou do Smartphone eu mantinha contato com muitas pessoas. A grande maioria sempre perguntava sobre mim, solidarizando-se com minha dor e mostrando amor. Mas o que me preenchia era quando eu podia ajudar alguém através de horas de conversas por áudio ou mensagem. Me sentir útil, fazendo o que gosto (ajudar pessoas) me fazia crer que, mesmo que as coisas piorassem, sempre haveria algo bom a ser feito ainda. Estar com a saúde em frangalhos e mesmo assim fazer a diferença na vida de alguém é algo renovador.

Quantas vezes me peguei chorando, aos prantos, com medo de parar numa cadeira de rodas ou ficar entrevada numa cama para sempre. O medo sempre me perseguia, as dores não me davam um minuto de folga... Mas olhar para meu marido e meu filho me acalentava o coração. O amor deles para comigo sempre foi algo incrível.


E o grande destaque que dou hoje, olhando pra tudo isso, é para os amores de minha vida: meu marido e meu filho. Você que leu meus antigos posts viu como sempre fomos apaixonados uns pelos outros. Viver momentos de alegria e saúde com quem amamos é maravilhoso! Mas é na hora da tristeza, na hora da doença que sabemos a real intensidade deste amor. Meu marido nunca desanimou, nunca reclamou, nunca se prostrou. Soube se adaptar à nossa nova realidade, cuidando da casa, dos gatos e do nosso filho enquanto eu ficava deitada. Quantas vezes, após chegar de um dia cansativo de trabalho, ele ia cortar cebolas e temperar a carne. Ou então levar o lixo na rua, dar uma varrida na casa, guardar as coisas, pendurar as roupas no varal. É claro que ele sempre me ajudou ao longo de nosso casamento, mas entenda... nessa época tudo ficou só para ele fazer, sem minha ajuda. E quando ele estava triste e eu perguntava "o que foi?" ele dizia "nada, meu amor, só estou um pouco cansado".

Quantas foram as vezes em que eu me senti culpada por ele viver aquilo. Imagine... sair de casa vendo sua esposa deitada, cheia de dores. Voltar pra casa no final do dia e ver que a esposa ainda estava deitada, ainda com dores. Viver um cansaço físico intenso, mas muito maior que isso, viver um cansaço emocional gigantesco. Mais uma vez, presenciei nosso Deus renovando suas forças sobrenaturalmente, dando ânimo e coragem para enfrenar o que fosse. E a cada dia enfrentávamos, juntos, aqueles meses terríveis.


Quanto ao meu filho... Meu coração dói ao relembrar. Perdi um ano inteirinho da vida social de meu amorzinho. Não vi sua apresentação do dia das mães, não fui ao shopping, à praia, ao parque, não fui nas reuniões de pais e mestres, não o acompanhei à igreja, não andei de mãos dadas na calçada. Todo aquele tempo fui mãe dentro de casa, deitada na cama ou sentada no sofá, com as pernas esticadas. Meu temperamento e minhas forças vindas de Deus me ajudaram a lidar com isso, brincando com ele, o acompanhando nos estudos e o educando. Tirávamos muitas fotos, filmávamos nossas brincadeiras e eu sempre chorava longe dele. Algumas vezes não conseguia esconder... Era quando ele me abraçava, me enchia de beijos e dizia "mamãe, Deus está cuidando de tudo, vai passar, eu te amo".

terça-feira, 24 de maio de 2016

Pesadelo

Após o diagnóstico dado pela reumatologista, iniciei meu tratamento tomando anti-inflamatórios, fortes analgésicos, colágeno hidrolisado e vitamina D. Segundo a médica, eu não poderia fazer nenhum tipo de atividade física ou fisioterapia, pois poderia ocasionar algum tipo de lesão. Primeiramente eu deveria me livrar das inflamações.

Com o passar do tempo não vimos melhora em meu quadro; as dores continuavam firmes e fortes. Mudamos os medicamentos várias vezes durante 10 meses, sem nenhum resultado. Sofri muito com os efeitos colaterais e durante este tempo permaneci trancada em casa, pois não conseguia caminhar. Andar de carro me trazia dores terríveis. Caminhar por mais de 50 metros me fazia chorar, tamanha dor que sentia. Muitas vezes minhas costas travavam e eu permanecia imóvel por vários minutos até conseguir me mexer novamente. A única posição que fazia com que minhas dores ficassem menos insuportáveis era a horizontal. Então era o que me restava: passar meus dias e noites deitada.

Foram 10 meses beirando a insanidade. Minha casa sempre desarrumada, pois eu não tinha condições de fazer absolutamente nada. As dores nas pernas irradiaram para a coluna lombar e meu corpo passou a sofrer um estresse. Todo o meu corpo passou a doer, todas as juntas, todos os membros. Sentia como se estivesse completamente dolorida. Qualquer movimento me trazia muita dor. Meu marido e meu filho faziam o que podiam, guardavam uma coisinha aqui, limpavam outra ali... Meu marido me ajudava fazendo o almoço e o jantar, tentando manter a arrumação que a faxineira fazia a cada 15 dias. Mas, por mais boa vontade que ele e meu filho tivessem, era impossível manter tudo limpo e em ordem. 

Minhas distrações eram a tv, leituras, orações, internet. Mantinha contato com as pessoas através do facebook, e-mails, conversas por messenger e por whatsapp. Muitas pessoas diziam estar orando por mim, pessoas de todo o Brasil e de alguns outros países. 


Eu não conseguia receber visitas, por mais que as quisesse. 

Quando olho para trás percebo nitidamente a mão de Deus me sustentando durante aqueles meses. Imagine... foram 10 meses indo do quarto para a sala, da sala para a cozinha, da cozinha para o quarto... sempre andando devagar, sempre com fortes dores, 24 horas por dia...

Foi quando, depois de 10 meses de tratamento, ouvi a conclusão da reumatologista:

- Infelizmente o seu tratamento não obteve o resultado esperado. Em outras palavras, já era para você estar bem melhor, sem dores. Não há mais o que se fazer. O ideal é que você procure outro médico, de outra especialidade. Mas se houvesse alguma chance de melhora, esta já teria acontecido.

Em outras palavras: "Você vai ficar assim pra sempre".

domingo, 15 de maio de 2016

Em busca de respostas

As dores nas pernas continuavam firmes e fortes. Conforme indicação do ortopedista, marquei consulta com uma reumatologista do meu plano de saúde, mas tal consulta seria só depois de alguns meses. Como não queria esperar por tanto tempo, fui a outra reumato pagando uma consulta particular.


Chegando à clínica fui muito bem recebida. Na sala de espera havia chás variados, cafés, bolachas, ar condicionado, tv, revistas atuais e funcionárias extremamente atenciosas. Porém, ao entrar na sala da médica, logo fui recebida por um olhar acusador. Estranhei muito, afinal, jamais havíamos nos visto. Ela percorreu o meu corpo de cima a baixo com os seus olhos, olhou fixamente para as minhas unhas que estavam com esmalte azul, olhou para o meu rosto e disse: "Sente-se. O que está acontecendo com você?".

Para não ser levada pela minha primeira impressão, comecei a relatar tudo como se estivesse sendo ouvida pela pessoa mais dócil do mundo. Depois de falar meu caso com detalhes, inclusive a opinião do ortopedista a respeito de uma possível fibromialgia, o que ouvi foi o seguinte:

- Você está com stress e vai precisar emagrecer muito se quiser alguma melhora no seu quadro, já vou adiantando. Como o seu corpo vai aguentar tanto peso assim? E a fibromialgia, nem vamos falar disso. Vamos fazer uma série de exames de sangue, mas essa dor não tem cara de nada grave.

Eu havia ouvido falar que a falta de vitamina D causa muitas dores, então perguntei se ela pediria este exame também. Ouvi um sonoro e mau humorado "Vou pedir aquilo que eu achar necessário". Sem me examinar, entregou o pedido dos exames, se levantou, abriu a porta e me disse "passe bem".

Saí daquele sala pra nunca mais voltar.


Esperei por alguns meses e então fui à reumatologista do meu plano. Que diferença! Uma médica atenciosa, que me ouviu olhando em meus olhos, que me explicou várias possibilidades de diagnóstico para o meu quadro e que disse que há muitas pessoas magras que sentem dores como as minhas. Não taxou o meu problema como "coisa de gente gorda". Me pediu uma série grande de exames de sangue, vasculhando tudo. Inclusive o tal exame de vitamina D.

Enquanto ela me examinava, tocando vários pontos de meu corpo, eu gritava várias vezes. Sentia muita dor! Então ela me disse: dos 18 pontos da fibromialgia, você sente dor em todos. Você está toda inflamada. Mas você só será diagnosticada com essa doença depois que todas as outras forem descartadas.

Entre fazer os exames e ir ao retorno, passaram-se quase dois meses. Ao olhar para o resultado, ela constatou que eu estava com falta de vitamina D, mas não num nível que me trouxesse tantas dores. Todos os outros exames estavam estáveis. Então, pegando minha ressonância da coluna e a eletroneuromiografia, ela disse:

- Você não tem problema algum relacionado à reumatologia. Seu problema é mecânico, uma disfunção relacionada à coluna. Observando a ressonância e a eletroneuromiografia, vemos que você está com artrose nas vértebras. Esta artrose está fazendo com que suas vértebras se aproximem e prendam o seu nervo ciático, por isso você sente tantas dores assim. Vamos tratar disso e você vai ficar boa! Você tomará alguns medicamentos para dor, inflamação e também para fazer sua cartilagem aumentar. Isso afastará as suas vértebras e soltará o seu nervo, trazendo alívio e vida normal. Mas você terá que ter paciência, esse tratamento costuma durar em torno de dois anos.

Sorri, feliz por saber que havia um diagnóstico. Eu não estava com "dores psicológicas", como alguns estavam pensando. Não estava com problema "por estar muito gorda". Havia uma explicação! Mesmo o preço altíssimo dos medicamentos e o tempo que eu teria que esperar para ver alguma melhora não tiraram minha esperança. Eu iria lutar, bravamente, mais uma vez.

sábado, 5 de setembro de 2015

A vez das pernas

O tempo passou e meu organismo registrou o maior número que a balança já me mostrou. Deixando de comer doces, massas e de tomar refrigerantes eu conseguia eliminar 5 quilos, mas esse número perto dos 40 quilos ideais que eu deveria eliminar era tão pequeno que nem era notado.

Minha vida e de minha família seguiu seu rumo. Apesar das dificuldades, nunca deixamos de nos divertir, conhecer novas pessoas, sermos ativos e ajudarmos o próximo. Nosso filho crescia, inteligente, simpático e muito brincalhão. Nosso relacionamento também crescia em amor e cumplicidade. Minha família era o meu alicerce dado por Deus.

Depois de morarmos por 4 anos naquela pacata cidade do interior, nos mudamos para a minha cidade natal, também no interior. Logo no primeiro ano morando por lá procurei um endocrinologista. Mais uma vez a conversa foi a mesma: cortar refrigerantes, açúcares, me alimentar de frutas, verduras, legumes, carnes magras, ingerindo pequenas porções de carboidratos 1x ao dia. Tudo isso fazendo uso da velha conhecida sibutramina. Lá se foram 14 quilos.


Como sempre acontece, minha determinação era grande. Desta vez eu não iria parar. Meu médico estava perto de mim, minha medicação estava em dia. estava fazendo exercícios diariamente na piscina além de fazer exercícios acompanhando programas de Jillian Michaels na TV.

Certo dia minha perna esquerda começou a doer. Como sempre senti dores pelo corpo todo, imaginei que seria mais uma dor que eu teria que me acostumar e não dei importância. A dor não só continuou ali como passou a aumentar. Até que um dia acordei de madrugada com uma dor insuportável, como se alguém estivesse dando vários beliscões fortíssimos por toda a minha perna esquerda! Chorando muito, fui levada pelo meu marido até o pronto socorro. Fui examinada por um residente que me indicou manter as pernas elevadas até que eu conseguisse uma consulta com uma especialista vascular. Tomei alguns analgésicos e fui para casa.

Até que eu conseguisse tal consulta se passaram dois meses. Foram dois meses tomando analgésicos comuns e mantendo as pernas para cima, em repouso, com medo de uma possível trombose. Parei de tomar a sibutramina com medo de ter possíveis complicações.

Após a consulta com a médica vascular foi constatado que não havia trombose ou problemas vasculares. A dor diminuiu um pouco com os analgésicos, a sensação de "beliscões" sumiu, mas continuei sofrendo. Minha qualidade de vida diminuiu ainda mais, só conseguia fazer pequenas caminhadas e sentar acompanhada de uma almofada nas costas.

Fui encaminhada a um ortopedista que me tratou durante 7 meses. Com ele fiz raio-x, eletroneuromiografia e ressonância magnética das pernas. Tomei vários medicamentos, porém sem grandes resultados.

Fui diagnosticada com artrose na coluna com possível compressão dos nervos ciáticos, mas havia suspeita de que eu estivesse também com fibromialgia. Fui então encaminhada a uma reumatologista para investigar outras possibilidades e até um possível câncer.

O julgamento alheio

Eu vinha caminhando bem. Estava emagrecendo, estava com mais ânimo, estava mais contente. Mas havia uma dificuldade em se ir da cidade onde eu morava até a outra cidade onde eu tinha o meu plano de saúde. Dependíamos de muitas outras coisas para que isso pudesse acontecer. Sendo assim, acabou a medicação, fiquei 2 meses sem ir ao médico e consequentemente sem conseguir a receita para comprar mais medicamentos. Mantendo o mesmo esquema de alimentação que fiz durante a dieta, nesses 2 meses eu adquiri 8 dos 14 quilos que havia eliminado. Nem preciso comentar sobre o desânimo e a tristeza que esse fato me trouxe...

Naquele momento percebi que, qualquer que fosse a medicação, meus problemas não seriam resolvidos assim. A cada quilo ganho, a sensação de impotência aumentava. E foi assim, num piscar de olhos, que fiquei mais gorda do que estava antes de iniciar a dieta.

O que sempre me chateou muito foram os julgamentos. Cada pessoa gorda tem um motivo para ser assim, mas quem é magro não entende isso. Para a maioria dos magros, tudo é questão de estilo de vida e de escolhas. Então a famosa frase "só é gordo quem quer" passa a ser uma máxima. Mas sejamos sinceros: você conhece algum gordo que quer ser gordo?


Convivi a minha vida toda com os julgamentos alheios. Mas, ao contrário do que se pensa, o julgamento não vem apenas daqueles que não te conhecem. Vem também dos que te conhecem de perto. Estes, piores do que os outros, conhecem o seu estilo de vida, vêm o seu esforço mas, mesmo assim, pensam que você só pode estar fazendo algo errado enquanto eles não o vêm. Imaginam que você come muitos doces e massas durante a madrugada, que come escondido, mente sobre suas justificativas e que exagera quando fala sobre suas dificuldades. Pensam que você não se esforça o bastante, não se doa o bastante, faz "corpo mole", arruma desculpa pra tudo e não emagrece porque não quer abrir mão de seus prazeres. E concluo que esses julgamentos são piores do que os de quem não o conhece.

A minha vida toda lutei para emagrecer. Você, que tem acompanhado este blog, tem tido um pouco de noção sobre as lutas que travei em relação a minha saúde. Mas garanto que ainda hoje ouço coisas que me deixam desacreditada na humanidade. Frases como "você precisa fazer uma forcinha", "precisa dar um jeito nisso", "precisa se dedicar mais", "precisa tomar jeito", "está assim porque é preguiçosa", "está colhendo o que plantou" são como apunhaladas em meu peito, principalmente quando vindas de pessoas que poderiam me dar apoio e compreensão ao invés de me acusar de tal forma.

Aprender a ignorar essas falas nunca foi fácil. Hoje consigo administrar de uma maneira mais madura tudo isso, sabendo que meu marido, meu filho e Deus sabem exatamente como é o meu dia-a-dia, como são as minhas lutas e o meu esforço. E é a opinião deles que me importa.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Tempo de mudanças

Eu e meu amor morávamos há quase dez anos na mesma cidade, desde que nos casamos. Nosso amor crescia, se solidificava e se tornava cada vez mais forte. Meu querido jamais falou qualquer coisa negativa a respeito de meu corpo, ao contrário, seguia sempre me incentivando, valorizando minhas qualidades e me apoiando. Quando nosso bebê estava para completar 2 anos resolvemos nos mudar e viver uma reviravolta em nossas vidas. Fomos para uma cidade pacata do interior, num bairro com muito verde, um lago imenso, muitas árvores e sossego.

Foram anos maravilhosos onde fizemos muitos amigos, realizamos várias coisas, trabalhamos, estudamos e nosso filho pôde viver a primeira infância de uma maneira saudável, rodeado de amigos, andando de bicicleta, correndo, subindo em árvores, brincando no mato e na terra.

Porém, nestes anos eu enfrentei momentos muito complicados com a minha saúde. 


Nós morávamos no terceiro andar de um prédio sem elevador. Eu subia e descia quatro lances de escada no mínimo uma vez ao dia. No primeiro ano achei incrível, afinal eu faria exercícios todos os dias, certamente emagreceria e ficaria com as pernas bem durinhas!

Engano meu... meus joelhos começaram a doer cada vez mais. Eu sentia como que agulhas gigantescas me perfurando os joelhos na parte da frente e atrás. Com o passar do tempo eu mal saía de casa, pois enfrentar as escadas tornou-se um pesadelo. As tão sonhadas caminhadas no lago não aconteceram, pois caminhar me traziam dores terríveis nas pernas e nas costas. Meu peso oscilava, eu perdia 3 quilos, ganhava 4, perdia 5, ganhava 3...

Foi então que eu busquei a ajuda de um endocrinologista. Sabendo do meu histórico de hipoglicemia, hipotireoidismo, dependência em anfetaminas e álcool no passado, ele me explicou que o meu organismo era uma bomba-relógio. Além do meu corpo ter um dos metabolismos mais lentos que ele já viu em toda a sua história como endocrinologista, ele também tinha um problema sério: ao mesmo tempo em que necessitava de açúcar (pois hipoglicemia é excesso de insulina e falta de açúcar), todo o açúcar ingerido se transformava em gordura. Então eu não conseguia jamais suprir as necessidades do meu organismo e o ciclo vicioso continuava de uma maneira que só me trazia prejuízos. Ao mesmo tempo em que eu não podia cogitar a possibilidade de ingerir doces, eu precisava de doces.  

O fato de eu estar com obesidade mórbida me dificultava para fazer qualquer exercício, incluindo as caminhadas pelo fato da dores nos joelhos. Fizemos um exame de raio-x para verificar se não havia artrose e deu negativo. O problema provavelmente provinha de outras complicações. E também me sentia extremamente cansada, com uma exaustão inexplicável e muitas dores em todas as articulações. Após vários exames de sangue constatamos que eu estava com falta de ferro, o que explicava consideravelmente minhas dores pelo corpo.


Após alguns exames físicos incluindo eletrocardiograma, começamos um tratamento com caminhadas leves e medicamentos, entre eles a sibutramina. Ele me assegurou que com a minha idade e meu histórico eu dificilmente conseguiria eliminar alguns quilos sem ajuda medicamentosa. Em 5 meses eliminei 14 quilos. A alegria e a esperança voltaram. Já subia as escadas com mais facilidade, as dores haviam diminuído, bem como o cansaço e desânimo. Naquele momento eu acreditei que finalmente a minha vida estaria mudando nesta área.

domingo, 26 de abril de 2015

Lutando mais uma vez

Engordei apenas 5 quilos durante toda a minha gravidez. No dia seguinte ao parto eu já estava com 5 quilos a menos, com o mesmo peso que estava no início da gravidez. Com a amamentação exclusiva, eliminei mais 10 quilos nos próximos 3 meses. Cheguei aos 100 kg com a maior felicidade do mundo. Estava vivendo um dos melhores momentos de minha vida, a paz e a alegria nunca foram tão intensas... Me sentia completa, realizada, feliz como nunca.


Estudiosos dizem que o nosso cérebro registra a última pesagem do nosso corpo e depois luta para chegar nesse número todas as vezes em que emagrecemos. Ali estava eu, quase saindo dos três dígitos, mas sentindo o meu corpo lutar para voltar aos 115 kg. 

Amamentei até o meu filho completar dois anos. Como as mamadas já não eram tão frequentes, comecei a engordar e fui dos 100 kg para os 110 kg aos poucos. Depois que parei com a amamentação, comecei a engordar mesmo mantendo a mesma rotina de alimentação saudável e caminhadas diárias. Meu corpo conseguiu voltar aos temidos 115 kg. Conforme os anos foram passando, o meu peso foi aumentando. Cheguei ao maior número jamais registrado: 125 kg.

Isso é o que as pessoas não entendiam e ainda não entendem a meu respeito. Quem não está comigo no dia-a-dia não imagina que me alimento como uma pessoa magra. Pensam que como o dia todo, coisas extremamente gordurosas e calóricas... Os olhares e julgamentos fazem parte de minha vida, sempre fizeram e continuam a fazer.

Naquela ocasião eu mantinha minha rotina de caminhadas dia sim, dia não. Me mantinha sempre em atividade, quem é mãe de pequenos sabe como é. Cuidava da casa, trabalhava como designer fazendo meus próprios horários. Não havia motivo para engordar tanto... 

Ao mesmo tempo em que eu me sentia realizada e plena como esposa, mãe e profissional, a angústia crescia por causa da cobrança da família e de alguns conhecidos em relação ao meu peso. Frases como "nossa, como o seu rosto é lindo" sempre vinham como um golpe em meu peito. Ninguém diz isso. A frase deveria ser "nossa, como você é linda" e ponto. Mas a ênfase no rosto sempre deixava claro que o rosto era lindo, mas o resto incomodava.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

O nascimento

O restante de minha gravidez foi mais calmo. Ao subir na balança da médica percebemos que eu havia eliminado alguns quilos, graças a minha alimentação regrada à frutas, legumes, verduras e carnes magras.

O calor era insuportável, então comia cada vez mais gelo entre uma refeição e outra.

Minha pressão estava regularizada, eu continuava sendo medicada. Também continuava tomando os remédios para "segurar" meu bebê em meu útero e o remédio da tireoide. Continuava em repouso. Tudo o que estava ao meu alcance, fazia.

Também orava muito, todos os dias, pedindo a Deus que abençoasse minha gravidez e permitisse que meu bebê nascesse saudável e perfeito fisicamente e mentalmente. Confiava que Ele faria o melhor, mesmo que meu bebê nascesse com alguma deficiência. Mas o desejo do meu coração era o de ter um filho perfeito.

No final do sexto mês os sangramentos cessaram e recebi alta de meu repouso. Fui liberada para subir escadas, desde que subisse bem devagar. Também pude andar um pouco mais de carro e fazer caminhadas curtas. Me alegrei muito com a notícia pois pude, finalmente, ir às lojas e comprar a decoração do quarto do bebê. Tudo foi decorado em branco, azul, verde e laranja. Muitos bichinhos também fizeram parte da composição do quarto. Finalmente a gravidez estava tomando um rumo gostoso, mais leve e tranquilo.

Porém, no final do sétimo mês os sangramentos voltaram e a pressão tornou a subir. Também fui diagnosticada como portadora de diabetes gestacional, algo perigoso para mim e para o bebê. Além de todas as possíveis complicações, o bebê poderia desenvolver diabetes tipo II após o nascimento. Voltei a ficar de repouso, porém desta vez com ainda mais cuidados. O bebê poderia nascer a qualquer momento. Já deixei a minha mala e a malinha do bebê prontas para a ida à maternidade.

Em minha última consulta, na 37a semana, a doutora me perguntou qual a data que eu gostaria de marcar a cesárea. Não havia possibilidade de se realizar um parto normal devido às minhas condições e mesmo a cesárea seria um procedimento de risco. Naquela altura já sabíamos que eu e meu bebê poderíamos correr risco de vida na sala de cirurgia.

Em meu coração pulsava uma data: Sábado, 10 de março. Mas olhando o calendário, seria melhor marcar para o dia 9 a noite, sexta-feira, pois meu marido teria todo o final de semana para estar comigo e só voltaria ao trabalho na segunda-feira. Então marcamos para o dia 09.

Eu estava caminhando para a 38a semana. Na véspera da cirurgia o meu coração estava acelerado demais... Muita ansiedade, muita adrenalina. A pressão começou a subir mais do que antes. Eu sabia que não poderia deixar esses sentimentos me dominarem, então pedi a Deus que me desse uma "anestesia dos céus". Eu precisava me acalmar... E foi logo após a minha oração que uma calma e uma paz que excedem todo o entendimento me invadiram. Aquela noite consegui dormir tranquilamente.

Finalmente, o grande dia chegou. O dia em que eu veria o rostinho daquele bebê tão amado, do meu menino querido, meu primeiro filho! Recebi muitos telefonemas durante o dia, flores e mensagens. A noite pegamos todas as nossas coisas e fomos para a maternidade. Já estava na hora!

Chegando lá, fizemos todos os procedimentos e fomos para o quarto. Nossos amigos mais chegados estavam todos lá, bem como alguns membros de nossa família. Todos ficaram no quarto, conversando, rindo e esperando com ansiedade o momento em que eu fosse para a sala de cirurgia. O tempo foi passando e a doutora não chegava. Foi quando uma enfermeira nos explicou que ela estava acompanhando uma outra mãezinha que estava em trabalho de parto, provavelmente teríamos que esperar um pouco mais para que a cirurgia fosse realizada. Nesse momento entendemos que o tempo de Deus é perfeito e começamos a comemorar aquela situação linda de pré-nascimento com uma verdadeira festa no quarto com muitas flores, alegria e até salgadinhos e refrigerantes.

Olhei para o relógio. O dia 9 estava acabando. Meu coração estava certo. Ele nasceria no dia 10.
Quando o relógio passou da meia-noite, a enfermeira abriu a porta e disse: "Mãezinha, está na hora".

Naquele momento toda a alegria sumiu. A ansiedade voltou, menor, mas voltou. Meu coração acelerou. Olhei para cada um e pedi que orassem por mim. Tive um pouco de medo. Fui conduzida pela enfermeira à sala onde colocaria a touca e o sapatinho cirúrgico. Me pesei: a balança marcou 115 quilos. No total de minha gravidez eu engordei apenas 5 quilos. Em outra sala me sentei na cama para receber a anestesia rack. Soube que a quantia de anestesia é dada conforme os quilos que a paciente tem. Nessa hora estremeci. Pedi para que o anestesista fosse cuidadoso pois eu tinha muitas dores nas costas. A dor que senti ao tomar a anestesia na coluna, na região lombar, foi indescritível. Meus dedos quase afundaram nos braços dos enfermeiros que me seguravam.

Respirei fundo. Me deitei na cama cirúrgica. Meus braços foram amarrados, um tecido azul foi erguido entre meu rosto e o resto de meu corpo. Comecei a ser monitorada. Orei entregando aquele momento à Deus.

Meu marido entrou no quarto, de touca e máscara cirúrgica, trazendo a máquina fotográfica em mãos. Ele me assegurou que não desmaiaria e que registraria todos os momentos do nascimento. Quando ele segurou em minha mão, um filme passou pela minha cabeça. Pensei em tudo o que havia vivido até ali. Pensei em minha mãe. Pensei em falar uma frase de despedida, caso algo desse errado, mas não consegui. Uma felicidade imensa começou a me invadir, uma alegria inexplicável.

- Eles já cortaram a sua barriga - ele disse. Estão mexendo em você agora.

Eu sentia toda a movimentação, mas não sentia dor. Os médicos conversavam entre si sobre os mais variados assuntos. Uma canção tocava pela sala. Meu coração estava acelerado, mas eu estava calma. Meu bebê estava nascendo, ele estava chegando pra mim.

- Amor, tá nascendo!

Foi então que ouvi a doutora dizer a ele, às 01h05:
- Oi, tudo bem? Estávamos esperando por você, querido. Seja bem vindo.


O choro invadiu a sala. Um choro forte que invadiu o meu coração. Ele estava vivo, ele estava bem, eu estava bem. Meu amor beijou a minha testa, começamos a chorar juntos.

- Eu te amo, meu amor. Eu te amo.
- Eu também, querido... eu também!

Naquele momento a minha cabeça deu um nó, um giro de 360 graus. Eu já não era mais a mesma, tudo mudou. Naquele momento eu também havia nascido, uma nova pessoa, uma mãe. Uma pessoinha dependia de mim a partir daquele momento e eu era responsável por ela. 

Um dos médicos trouxe o nosso bebê para que o víssemos. Tão lindo, tão maravilhoso, com a mesma carinha que vimos no ultrassom. Não queríamos mais nos separar dele, mas ele teve que ser levado para os procedimentos necessários. A minha cirurgia continuou até que toda a cesárea fosse concluída. 

Fui levada na mesma cama ao corredor do hospital e já naquele momento comecei a sentir que a anestesia estava passando. Pedi à doutora que me desse algo para aliviar a dor e ouvi uma das respostas mais difíceis de minha vida:

- Querida, você não pode tomar nenhum tipo de medicação agora, a sua pressão está muito alta. Peça a Deus para te dar forças, quando você puder as enfermeiras lhe trarão algum alívio.

Respirei fundo e pedi a Deus que me ajudasse a passar por aquele momento. Fui levada na cama ao quarto e ali permaneci por algumas horas, sentindo toda a dor da operação. Minhas costas e minhas pernas também doíam muito e eu não conseguia descansar nem dormir.

No meio da madrugada a enfermeira mediu minha pressão e me deu analgésicos. Quando comecei a sentir um pouco de alívio das dores, a porta se abriu e outra enfermeira entrou, trazendo o meu bebezinho em uma caminha sobre um carrinho hospitalar.

- Aqui está o seu filhão, ele é lindo. Ele vai ficar aqui com vocês a partir de agora. Já está bem limpinho e tomou algumas horas de luz. É bom que você tente dar de mamar a ele agora.


Quando o segurei pela primeira vez senti algo indescritível. Por mais que eu usasse palavras para dizer o que senti, jamais conseguiria. A emoção, a alegria e a realização são tremendas! Ofereci meu seio a ele que depois de alguns minutos começou a produzir o colostro. Ele mamava um pouco tímido no começo, mas logo se aninhou em meus braços e se sentiu confortável para se alimentar e receber todo o carinho que eu tinha para lhe dar. Seu pai observava aquela cena com lágrimas nos olhos. Nós não conseguíamos parar de nos emocionar.

Na manhã seguinte recebemos a visita de um médico. Ele pegou a minha ficha, leu e me disse: 

- Hummmm... teve pré-eclâmpsia, né? E foi grave. Mas agora está tudo bem, né? Você está se sentindo bem, seu bebezinho já está aí com você, está tudo bem!

O quê? Eu tive pré-eclâmpsia? Sim, eu tive. E depois eu soube que minha pressão estava tão alta e minhas condições eram tão graves que se eu tivesse eclâmpsia, dificilmente sobreviveria. O bebê também correu risco de vida. Mais uma vez vivi um milagre.

Então o doutor continuou:
- Muito bem, muito bem, diferentemente dos outros bebês que sempre tiram no máximo nota 9 no teste apgar, esse meninão aqui tirou nota 10. Papai e mamãe, vocês têm um filho perfeito, parabéns.

Naquele instante eu soube que meu filho não era apenas perfeito fisicamente, mas também mentalmente. Deus havia dado um recado a nós dois. Ele havia realizado o milagre que tanto pedimos. Nosso filho era perfeito, em todos os sentidos.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

A gravidez

Este capítulo é um pouco longo. Imagine resumir 9 meses em poucas linhas! Sim, hoje vou falar sobre minha gravidez!

Após 7 anos de casamento, eu engravidei. Foi um dos momentos mais felizes de minha vida! Eu e meu amor havíamos planejado esperar alguns anos antes de termos um filho e tudo ocorreu conforme o planejado. Ali estava eu com trinta e poucos anos, grávida de meu primeiro filho.

Eu estava com 110 quilos e sabia que precisaria cuidar muito bem de minha saúde para não engordar horrores. Estava tendo um pequeno sangramento, algo que muitos me disseram que poderia ser normal no início da gravidez. Então, sem pensar duas vezes, passei a caminhar 1 hora por dia, mesmo com muitas dores nos joelhos. Passei a tomar ácido fólico e a maneirar naquilo que eu sabia que poderia me fazer engordar facilmente, como carboidratos e açúcares.

Mas já na primeira consulta oficial com a obstetra, recebi a notícia: aquele pequeno sangramento não era normal como eu havia imaginado. Era sinal de que algo estava errado. Tive que fazer repouso até saírem os resultados dos exames. Após alguns dias eu soube que havia acontecido um descolamento da placenta, algo comum, porém que necessita de cuidados. Permaneci então no leve repouso, evitando escadas e longos minutos em pé. Permaneci assim até passar do terceiro mês. Quando me pesei já havia ganho 3 quilos.


Minha pressão arterial começou a subir. Achei estranho pois normalmente ela era baixa. Foi quando minha obstetra decidiu me acompanhar de perto, fazendo com que eu fosse ao seu consultório a cada 10 dias. Logo vi que minha luta por aquele filho não seria fácil. Eu já não era tão nova e minhas condições de saúde não estavam ajudando. No quarto e quinto mês continuei em repouso, porém desta vez com mais rigidez, o chamado "repouso absoluto". Deveria evitar de andar, permanecendo deitada 90% do tempo. Não saía de casa, a menos que fosse à consultas médicas.

Por todos esses meses continuei a sangrar esporadicamente, às vezes em maior quantidade. Sempre telefonava à medica pedindo seus conselhos e ajuda. A parte descolada da placenta já havia colado, não conseguíamos encontrar o motivo dos sangramentos. Por algumas vezes tive que ser examinada. Certo dia sangrei tanto que precisei ir com urgência ao pronto socorro no meio da madrugada. Meu marido segurava a minha mão, chorando comigo, enquanto a médica plantonista fazia o ultrassom sem esboçar nenhuma reação. Depois de alguns minutos, finalmente ela ouviu o coraçãozinho do bebê e o viu se mexendo com vigor. Estava tudo bem com ele, graças a Deus! Voltamos chorando para casa, agradecendo a Deus.

Minha fé em Deus em nenhum momento foi abalada, pelo contrário. 

Percebi, com toda aquela dificuldade, que quanto mais nós não temos o controle sobre a situação, maior é o momento de aprender a depender dEle. Deus nunca falha e faz sempre o melhor para as nossas vidas, mesmo quando aquilo que Ele faz não tem "cara" de coisa boa. Passei cada vez mais a ter certeza de que o nascimento de meu filho seria um milagre.

Minha pressão continuava a subir. Os sangramentos não paravam. Eu estava tomando medicamentos para segurar o bebê dentro de meu útero e não passar por um aborto espontâneo. Foi quando fui ao endocrinologista para fazer um exame e ver como estava o meu hipotireoidismo. O susto foi grande quando o resultado chegou: estava totalmente desregulado! Aumentamos a dosagem do remédio da tireoide e passamos a monitorá-la com cuidado a partir de então.

Então um dia fui chamada pela obstetra para ter uma conversa séria. Ela me dizia para eu me manter calma, que tudo daria certo, que tudo iria acabar bem. Confesso que essas palavras me assustaram bastante. Enquanto eu me deitava na sala ao lado, sobre o meu braço direito levantado para que minha pressão baixasse, ela conversava com a minha sogra. Eu morava na cidade da família de meu marido e por isso não tinha ninguém do meu sangue me acompanhando de perto em toda essa situação. 

Depois de 20 minutos de espera, ela voltou, mediu minha pressão e disse "ótimo, ótimo, baixou". Então começou a me dizer que eu não poderia mais engordar nem uma grama sequer, pois isso traria sofrimento fetal. Eu havia engordado 6 quilos em 5 meses de gestação e se continuasse nesse ritmo, engordaria facilmente de 12 a 15 quilos até o final. Entrei em desespero! Como eu faria para parar de engordar, sendo que eu mal comia? Passei a tomar remédio para baixar a pressão, além de continuar tomando o remédio da tireoide para segurar o bebê em meu útero. A luta ficava cada vez mais difícil.

Quando entrei no elevador com a minha sogra, ela começou a chorar desesperadamente. Assustada, perguntei o que estava acontecendo e ela me contou:
- A doutora não quis te assustar, mas ela conversou comigo! Ela me alertou que se você continuar assim, com a pressão subindo, engordando e sangrando, você vai perder o bebê! Ela está muito preocupada, meu Deus, você está prestes a perder essa criança!


Meu Deus, o que me restava? Já estava tomando os remédios, já estava comendo apenas comida, mal comia pão ou macarrão, quase não tomava refrigerantes... Não podia caminhar devido ao repouso! O que me restava?

Foi quando perguntei à médica se eu poderia fazer dieta e ela disse que eu deveria fazer. Me explicou que o bebê adquire energia da gordura da mãe obesa. A partir daquele dia passei a comer frutas, legumes, verduras e muita água. Não comia carboidratos, nem arroz, nem feijão. Só comia carnes magras. E comia muita carambola. Se eu tive um desejo nessa gravidez, foi de comer carambolas ainda um pouco verdes, bem geladas. Eu comia gelo também, muito gelo, o dia todo. Fazia mais de 40 graus e eu não aguentava o calor. Cheguei ao ponto de passar o dia apenas comendo carambolas e gelo.

Estava no sexto mês de gestação, tomando vários medicamentos, fazendo repouso absoluto, lutando com todas as minhas forças para não perder o meu bebê. Buscava em Deus o consolo e a força necessária, sozinha eu não conseguiria. Meu amor sempre ao meu lado, sofrendo comigo, vibrando com cada dia que passava e nosso bebê permanecia dentro de mim.

Então, durante uma madrugada acordei sangrando novamente, em grande quantidade. Acordei o meu amor aos prantos e fomos ao hospital. Os aparelhos de ultrasson não estavam funcionando. Precisei ser examinada manualmente pelo ginecologista que estava de plantão, em uma mesa fria de aço, sob as luzes fluorescentes, sem pano algum nos separando. Enquanto ele mexia dentro de mim, meu amor segurava em minhas mãos orando para que não fosse nada grave. Então o doutor nos disse:

- Olha, o seu útero está fechado. O seu bebê está aí dentro. Não há o que se fazer. Se você perder o seu bebê, irá perdê-lo aqui ou em qualquer outro lugar, não há como evitar. Você prefere ficar aqui internada ou prefere ficar em sua casa?


- Eu vou pra casa - respondi. Andando muito devagar, voltei para casa, amparada pelo meu amor. Nos deitamos na cama e oramos. Mais uma vez entregamos o nosso bebê a Deus, sabendo que Ele saberia o que seria melhor para nós. Independentemente do que acontecesse, Deus continuaria sendo bom.

No dia seguinte fui à medica, contei o ocorrido. Fiz um ultrasson e constatamos que estava tudo bem apesar do sangramento inexplicável que não parava. Já sabíamos que era um menino que estava dentro de mim. Um guerreiro, como a mãe. Escolhemos um nome significativo, um nome composto que fazia menção a dois discípulos de Jesus. Queríamos que ele tivesse as qualidades que aqueles dois homens tiveram.

Naquele dia a médica me disse que precisava falar algo muito difícil de se falar. Então ela me contou que meu bebê tinha 90% de chances de nascer idiota, devido à minha tireoide ter ficado desregulada por tanto tempo durante a gravidez e devido aos sangramentos e sofrimento fetal. Ela me explicou que idiota é uma criança com um QI baixíssimo, incapaz de realizar os raciocínios mais fáceis e de guardar as informações mais básicas. Segurando minha mão, ela me disse que Deus era o médico dos médicos e que poderia me agraciar com os 10%, mas que isso seria muito pouco provável de acontecer, só mesmo um milagre.

Voltei pra casa, me ajoelhei e chorei. Chorei agradecendo a Deus pelo meu bebê, chorei porque já o amava tanto, chorei porque mesmo com aquela notícia terrível eu sabia que Ele poderia fazer um milagre. Chorei por horas. Quando contei ao meu amor, choramos juntos, oramos juntos e pedimos a Deus forças para passar por aquilo. Se essa fosse a vontade do Senhor, que Ele nos desse forças para enfrentar todas as dificuldades que teríamos dali por diante. Que Ele nos ajudasse a enfrentar um mundo que tem atitudes tão hostis com pessoas deficientes.

Chorei por mais alguns dias. Depois lavei meu rosto, enxuguei minhas lágrimas, respirei fundo e me preparei para enfrentar o restante de minha gravidez.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

O inesperado

Tudo é lindo no início do casamento! A lua-de-mel, a chegada em casa e as primeiras horas abrindo os presentes de casamento, as primeiras comidinhas feitas a dois, a delícia de não ter horário para chegar em casa, a liberdade, a independência. Viver a dois é uma delícia! Estávamos vivendo um sonho. Depois de tantos anos de namoro, finalmente estávamos juntos em nossa casa, em nosso lar.

Como não pretendíamos ter filhos logo, comecei a tomar pílula anticoncepcional. Ao comentar com o médico sobre a minha facilidade em engordar e a dificuldade em emagrecer, ele me receitou a pílula "mais fraca" que existia na época e fiquei tranquila em tomá-la. Na época eu estava com 75 kg.

Conforme os meses foram passando, eu comecei a engordar. Rapidamente ganhei 10 quilos, mas as roupas ainda me cabiam apesar de ficarem um pouco justas. Certo dia, ao colocar a calça jeans, percebi que ela já não fechava mais. Na semana seguinte, várias roupas já não me serviam. Estava com muito medo de me pesar, apesar de perceber os olhares das pessoas... aquele velho olhar que me davam todas as vezes em que eu estava gorda.

Quatro meses após o meu casamento tomei coragem e subi na balança. Naquele momento, quando me deparei com os números, comecei a chorar. Um choro terrível, dolorido, cheio de frustração, medo e desesperança. Eu havia engordado 40 kg em 4 meses. Nunca, em toda a minha vida, havia estado tão gorda. A partir daquele momento eu não era apenas uma pessoa gorda, mas alguém com obesidade mórbida.

Lidar com esse fato dentro do meu casamento foi algo extremamente difícil. Mesmo com todo o amor, compreensão e carinho demonstrados pelo meu marido, eu me sentia horrível. Não conseguia entender como ele poderia sentir atração por mim. Mas ele continuava dizendo que eu era linda, que mesmo gorda eu mexia com os seus instintos, que meu corpo era cheio de curvas... O seu apoio e seu amor incondicional me ajudaram a passar por essa fase de uma maneira menos dolorosa.


Não entendia o porque de ter engordado tanto! Decidida mais uma vez a lutar, fui eliminando alguns alimentos, deixando alguns hábitos... mas nada era capaz de impedir que meu corpo adquirisse maior peso. Foi quando pensei nas pílulas anticoncepcionais. Parei de tomá-las e imediatamente parei de engordar.

Fui a outro ginecologista que me explicou que se eu engordei tanto com uma pílula tão fraca, então provavelmente eu não poderia mais tomar pílulas. Por alguma razão o meu organismo reagia daquela forma e não era possível impedir. Eu teria que usar outros métodos anticonceptivos.

Então lá estava eu, com meus quase trinta anos, tendo que lidar com um excesso de peso que nunca havia sido tão grande. Se eu já tinha dificuldade em perder peso antes, imagine naquele momento. Fazer caminhadas era um sacrifício enorme, meus joelhos e pés doíam muito, a letargia insistia em me acompanhar. Leves picos de tristeza faziam parte do meu dia-a-dia. 

Após alguns anos ganhando e perdendo em torno de 5 quilos, tomei a decisão de não mais tomar nenhum tipo de medicamento para emagrecer. Queria tentar algo novo. Foi então que li um livro intitulado "Livre Para Emagrecer, Graças a Deus" de Neva Colye e Marie Chapian. Através da contagem diária de calorias, leituras bíblicas e algumas orientações práticas, o livro me ajudou a eliminar 11 quilos. Nunca em toda a minha vida eu havia conseguido emagrecer sem o uso de medicamentos. Porém, parando de me policiar e comendo sem prestar atenção às calorias, ganhei todos os 11 quilos novamente.

Percebi naquele momento que, se eu quisesse manter um corpo magro e saudável, eu teria que me policiar pelo resto de minha vida. Lembrei-me da primeira consulta que fiz com o Dr. Alpredo Halpern, a maior autoridade da américa latina em endocrinologia. Ele me disse:

"Você precisa entender que tem uma doença crônica chamada obesidade. As pessoas não gostam de tratá-la como doença, mas é o que ela é. Você terá que tomar providências a respeito disso pelo resto de sua vida. É uma doença que precisa ser tratada e controlada diariamente. As calorias são ferramentas dadas por Deus pra que você consiga ter o controle sobre o que entra ou não através de sua boca. Você deve controlar as calorias e não deixar que elas controlem você. Essa conversa de que 'só é gordo quem quer' é a maior furada. Pergunte para qualquer gordo se ele quer emagrecer e você saberá a resposta."


quinta-feira, 2 de abril de 2015

Uma nova história

O tempo passou e conheci uma pessoa incrível que se tornou o meu melhor amigo. Foram meses de uma amizade super gostosa onde contei a ele tudo o que contei neste blog e um pouco mais. Ele sabia de minha vida com detalhes que ninguém mais sabia e me aceitava do jeito que eu era, me valorizava pelas minhas conquistas e me dava força nas minhas lutas. Vivíamos muitas aventuras juntos, compartilhávamos um com o outro das maiores tristezas, alegrias, anseios, sonhos... Éramos totalmente diferentes um do outro e talvez justamente por esta causa, nos dávamos muito bem.

Nos dávamos tão bem que nos apaixonamos e começamos a escrever uma história de amor linda juntos, muito melhor do que qualquer uma que eu já tivesse vivido. Ele jamais me cobrou de nada, sempre me tratou com dignidade e sempre deixou claro que me amava e me achava lindíssima, estivesse o meu corpo como estivesse, magro ou gordo. Sempre me admirou e teve orgulho de mim, sempre me elogiou em público ou em particular. Esse amor gigante e intenso dele por mim me ajudou a enxergar cada vez mais que eu deveria sim buscar cuidar de meu corpo, mas não tentando alcançar um corpo ideal ou a magreza tão sonhada. Que agora eu tinha alguém ao meu lado para me acompanhar e me apoiar em todas as minhas escolhas.

Depois de alguns anos, ele me pediu em casamento. Foi um momento lindo, uma surpresa maravilhosa entre vários amigos nossos que nos aplaudiram muito ao ouvirem o pedido. Ficamos noivos ali mesmo, naquele momento.

A partir de então começamos a procurar tudo o que nos seria necessário: fotógrafos, filmagem, decoração, salão de festas e tudo o mais. Mas ao me olhar no espelho, vi que o meu sonho de entrar maravilhosa na igreja não poderia ser acompanhado de um vestido enorme. Eu precisava emagrecer pelo menos 15 quilos pra me sentir bonita e bem em um vestido branco!

Foi então que, deixando de lado todos os conselhos e todas as lembranças, resolvi tomar anfetaminas novamente. Eu sabia que o resultado seria eficaz, mesmo que eu engordasse tudo depois. Pisando em cima de todo e qualquer bom senso que eu poderia ter naquele momento, procurei aquele antigo médico, que me dava aquelas antigas receitas...

Quando olhei pra ele, comecei a tremer. Sabia que não deveria fazer aquilo. Respirei fundo e disse:

- O senhor se lembra de mim, não é? Eu não posso mais tomar anfetaminas do jeito que eu tomava antes... mas eu preciso emagrecer rapidamente, eu vou me casar e quero entrar lindíssima na igreja. O senhor não teria algum outro remédio que faça um efeito parecido, mas que não contenha os mesmos componentes das fórmulas que o senhor me receitava?

Foi então que ele me deu uma fórmula diferente. Algo que tinha sim alguma relação com as anfetaminas, mas que não era tão forte. Eu pensei, de verdade, que aquilo não fosse me fazer mal, já que haviam-se passado vários anos desde a minha dependência. O tratamento com dieta e medicação duraria alguns meses.

Como já era de se esperar, o remédio me tirou totalmente a fome. Para emagrecer mais rápido, eu passava o dia comendo frutas, legumes, queijo branco e barrinhas de cereais. Emagreci tudo o que queria, mas nesse meio tempo desmaiei algumas vezes, tive vertigens, fraqueza e alguns episódios depressivos aqui e ali. Também percebi que algumas sensações emocionais e psicológicas da época em que eu usava constantemente as anfetaminas voltaram. Tudo isso em meio à correria dos preparativos do casamento. Se uma noiva "normal" já enlouquece, imagine eu...


Enfim, chegou o grande dia!

Todos os preparativos, toda a correria, toda a loucura, todos os gastos valeram a pena! A nossa felicidade naquela dia era sem tamanho, nosso sonho havia se realizado, éramos o casal mais feliz do mundo!

Ali estava eu, entrando na igreja, linda, com uma coroa maravilhosa em minha cabeça, um véu imenso, o vestido que eu mesma havia desenhado, os bordados de strass brilhando, a cauda de quase 3 metros se arrastando no chão, o buquê lindíssimo em mãos, a luz focada em mim, todos me olhando e sorrindo... Tudo perfeito, tudo como eu sempre sonhei. Não era uma gorda imensa entrando num vestido branco enorme. Eu estava linda, com um corpo lindo. Enquanto eu entrava e olhava para o meu noivo, o tempo parecia ter parado. Uma sensação surreal... eu sentia como se estivéssemos só nós dois, enquanto eu caminhava em direção a ele ao som da música que embalou o nosso amor por tantos anos, o tema de "A Bela e a Fera".

Ali naquele altar, diante de centenas de pessoas, nós juramos amor eterno. Juramos ser fiéis na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, por todos os dias de nossas vidas, até que a morte nos separasse. E para isso empenhamos a nossa honra.

Ali, naquele momento, onde tudo estava tão perfeito, jamais imaginaria o que me aconteceria alguns meses depois.

domingo, 29 de março de 2015

O furo na parede

Se lembra quando eu disse que, ao receber de Deus a cura de minha dependência em anfetaminas, não significava que Ele houvesse apagado o meu passado e nem me livrado das consequências de tudo o que fiz? Deus "tirou o prego", mas em sua soberana vontade, manteve a marca, o "furo na parede".

As consequências foram aparecendo, cada vez mais fortes conforme eu envelhecia. O meu organismo continuou debilitado, fraco, sem energia. Meu metabolismo foi seriamente atingido, tornando-se cada vez mais lento, dificultando a perda de peso. Mesmo assim, eu continuava lutando.

Desenvolvi o hipotireoidismo.

A tireoide é uma glândula importantíssima para o funcionamento harmônico do organismo. Os hormônios liberados por ela, T4 (tiroxina) e T3 (triiodotironina) estimulam o metabolismo. O hipotireoidismo é um distúrbio da tireoide que passa a ter nenhuma ou baixa produção de hormônios. Com essa disfunção passei a ter muito cansaço, depressão, adinamia (falta de iniciativa), pele seca e fria, diminuição da frequência cardíaca, decréscimo da atividade cerebral, inchaço, sonolência, reflexos mais vagarosos, intolerância ao frio, alterações menstruais e ganho de peso. Tive que começar um tratamento que duraria para o resto de minha vida.

Também me tornei uma pessoa hipoglicêmica.

A hipoglicemia é um distúrbio provocado pela baixa concentração de glicose no sangue. Os quadros de hipoglicemia se instalam quando aumenta a quantidade de insulina no sangue, quando diminui a quantidade de hormônios do crescimento, adrenalina e cortisol. Os sinais da hipoglicemia podem ser produzidos pelos hormônios de contrarregulação e pela redução de glicose no cérebro. No primeiro caso, os sintomas são tremores, tonturas, palidez, suor frio, nervosismo, palpitações, taquicardia, náuseas, vômitos e fome. No segundo, confusão menal, alterações do nível de consciência, perturbações visuais e de comportamento que podem ser confundidas com embriaguez, cansaço, fraqueza, sensação de desmaio e convulsões. No início me foi muito difícil aprender a controlá-la, mas com o tempo consegui entender os sinais dados pelo meu corpo. Não há medicamentos a serem tomados, é necessário prevenir as crises restringindo a ingestão de açúcares e se alimentando a cada 2 ou 3 horas.

Sempre tive dificuldade para dormir nos horários convencionais, isto é, enquanto todos dormiam eu ficava acordada e vice-versa. Tenho o chamado "cronotipo vespertino". Porém, depois de tudo o que me aconteceu, essa peculiaridade de minha vida se acentuou, passando a me prejudicar no dia-a-dia, no trabalho e nos estudos.

Minha dificuldade de concentração e de memorização também permaneceram e foram ficando maiores conforme o tempo foi passando. Foi com muita dificuldade que consegui concluir os meus 5 anos de faculdade. Só eu sei o quanto sofri para acordar cedo todos os dias, permanecer atenta às aulas, fazer as leituras de livros e mais livros, realizar trabalhos, fazer projetos, apresentar seminários... Não contava a todos sobre o meu "passado trágico", mas ao mesmo tempo me era extremamente difícil não ter como explicar minhas dificuldades sem tocar nesse assunto.

Fui à vários endocrinologistas nos anos seguintes, sempre buscando novas alternativas. Eu não desistiria de lutar contra o excesso de peso. De tempos em tempos tentava uma loucura, como a dieta da lua, a dieta do ovo, a dieta da sopa, dieta naturalista, dieta dos carboidratos... Fazia exercícios regularmente e vez ou outra tomava medicamentos "leves", sem nenhum composto que tivesse co-relação com anfetaminas. Apesar de entender que eu era bonita estando magra ou gorda, meu sonho em ter um corpo que não fosse notado de maneira negativa continuava permeando os meus pensamentos.

sábado, 28 de março de 2015

Levantando os olhos mais uma vez

Eu me sentia sozinha, mas não estava sozinha. 
Deus estava comigo e se fazia presente de várias formas.

Uma das formas mais inusitadas foi através de uma mulher muito doce e bondosa que soube da minha situação e se compadeceu. Ela havia sido deixada pelo marido anos antes e apesar de sua experiência ter sido bem diferente da minha, ela sabia muito bem qual era a dimensão da dor que eu estava sentindo. Ela foi até a minha casa, contou toda a sua história, me deu esperança e me ofereceu ajuda. Prontamente aceitei. Então ela marcou uma consulta com o seu médico e me levou para que eu começasse um tratamento contra a depressão.

Comecei a tomar os medicamentos receitados e após algumas semanas comecei seguir à risca as orientações do doutor. Ocupei o meu tempo com atividades, me distraí e só me deitava na cama após estar sob o efeito de uma das pesadas medicações. Foi então que depois de algumas semanas eu entrei em vários cursos durante o dia, comecei a passar horas na academia diariamente e fazer cursinho durante a noite. Ocupei todo o meu tempo, mas de nada adiantou, eu pensava em tudo o tempo todo. Minha cabeça não parava de pensar e pensar e pensar...

Alguns velhos amigos da época de minha adolescência se reaproximaram de mim. Pessoas que também tinham um relacionamento diferenciado com Deus. Com eles fiz novas amizades e então comecei a participar de algumas atividades em conjunto. Esta é uma parte de minha vida que me lembro até hoje com muito carinho e muitas saudades. Estas pessoas me ajudaram a passar por esse momento delicado, choraram comigo, me fizeram rir muito e me mostraram que valia a pena viver. Com vários deles tenho amizade até hoje. Alguns poucos da minha "época louca" se reaproximaram também. Pude conversar a respeito de tudo o que me aconteceu e nosso relacionamento tomou novas proporções, com amadurecimento e respeito.

Foi um ano de restabelecimento do meu amor próprio, de me dar valor, de entender que eu era uma criatura amada por Deus e que ele tinha muitos planos para a minha vida. Escolhi me aprofundar cada vez mais em meu relacionamento com Ele, lendo as Escrituras e falando com Ele através das orações, diariamente.

Com o restabelecimento de minha saúde, comecei a ganhar peso novamente. Porém, estranhamente já não me abalava tanto o fato de estar acima do peso. Tudo o que passei me fez enxergar a vida de uma forma um tanto quanto diferente. Se era gordinha que eu ficaria pro resto da vida, então eu teria que aprender a conviver com isso da melhor forma. Entendi que, naquela altura dos acontecimentos, eu deveria me manter longe de qualquer medicamento para emagrecer. Mesmo que isso me fizesse estar no time das meninas com sobrepeso, as chamadas "plus size" dos dias atuais.

Meu corpo nunca foi feio. Sempre tive cintura proeminente, coxas grossas, bumbuns e seios proporcionais a todo o resto. Sempre fui muito elogiada pela beleza de meu rosto e de meus olhos verdes. E ali, naquele ano, comecei finalmente a enxergar que era bonita, estando magra ou gorda.

sexta-feira, 27 de março de 2015

O duro golpe

O fato de eu ter sido curada da dependência não significava que eu também houvesse sido curada das consequências do uso indiscriminado de anfetaminas. Recebi um presente indescritível de Deus, mas como todo prego tirado da parede, as marcas ficaram.

A guerreira que sempre fez parte de mim respirou fundo. Levantou-se e decidiu-se por começar um novo tempo, um novo caminho. Seguiu em frente sem olhar para trás.

A partir daquele momento tudo mudou. Deixei de ir aos lugares que frequentava antes do processo de desintoxicação. Já não fazia mais sentido continuar a viver uma vida que me trouxe tantos estragos. Não foram os meus amigos, os shows, o rock ou os meus costumes que me levaram para onde fui, mas todo o contexto contribuiu grandemente para que eu me perdesse no meio do caminho. Naquele momento já não me era possível separar as coisas. A minha vida louca de saídas e rock´n´roll estava intimamente entrelaçada com os meus maus costumes, com o álcool, com as anfetaminas.  Eu jamais conseguiria fazer uma coisa sem viver a outra.

Meu lado espiritual também mudou. Voltei a ter um relacionamento com o Eterno e busquei nele as forças necessárias para atravessar aquele momento de adaptação a uma nova vida.

Passei a ouvir outros estilos musicais, pois qualquer menção de música rock me trazia memórias auditivas que me faziam extremamente mal. Sentia muita falta de tudo e de todos, da adrenalina da vida noturna, das frases sem sentido e das risadas sem motivo. Justamente agora que eu havia resolvido mudar de vida, toda a tristeza e decepção pareciam ter desaparecido, restando apenas as boas lembranças das amizades e das farras. Era como se o meu subconsciente me impelisse ao auto-sabotamento novamente.

Me mantive firme. Estava caminhando bem. Foi quando o meu namorado da época desistiu do namoro. Ele não queria viver a mudança de vida comigo e não seríamos capazes de manter um relacionamento trilhando caminhos tão diferentes. Na verdade quem teve que fazer essa escolha fui eu, pois ele me disse que se eu conseguisse me manter sóbria e limpa em nosso "antigo mundo", sem me relacionar com o Eterno de maneira tão intensa, ele continuaria comigo. Mas aquele era uma realidade inexistente, uma alternativa nula.


Quando ele foi embora, meu mundo desabou. A reserva de forças que eu havia guardado cuidadosamente em meu coração se espalhou feito vento. O medo, o desespero, a agonia, a profunda tristeza voltaram com toda a fúria. Eu o amava mais do que tudo, planejávamos nos casar em pouco tempo, havíamos vivido juntos as melhores e piores experiências. Não conseguia nem sequer fazer menção de uma vida sem ele. A depressão voltou mais forte do que nunca, mas com uma ressalva. Desta vez eu não tinha onde me refugiar, nem nas anfetaminas e nem no álcool. Como foi difícil não recorrer a eles! Meu corpo gritava por isso, meu sangue pulsava clamando pela bebida. Meu Deus... Meu Deus... Sim, eu só tinha a Deus naquela hora.

Mas não aguentei. Estava fraca, sozinha e vulnerável. Fui ao supermercado e comprei uma garrafa de whisky. Tomei ali na rua mesmo, sentada na calçada. Gole a gole, terminei a garrafa toda de uma só vez. Voltei para casa pior do que nunca. Entrei debaixo do chuveiro e chorei uma eternidade.

Parei de comer. Parei de fazer planos. Parei de querer viver. A vida já não fazia sentido algum. Eu não tinha pra onde ir, não tinha o que fazer. Os meus amigos se foram, nenhum deles apareceu para me estender a mão. Eu teria que começar tudo do zero, fazer novos amigos, escolher uma faculdade para entrar, pensar no futuro. Que futuro? Qualquer futuro sem o amor da minha vida não fazia o menor sentido. Mil coisas vieram à minha mente... Se ele realmente me amasse, ficaria comigo em qualquer situação. O sentimento de fracasso e humilhação me acompanharam por dias e dias.

Eu só ficava deitada em minha cama, chorando sem parar. Quando não chorava copiosamente, permanecia com o olhar distante enquanto as lágrimas escorriam sem qualquer controle. Não comia, não bebia, não falava. Não dormia, a não ser quando a exaustão me dominava. Não estava entendendo nada, absolutamente nada do que me estava acontecendo naquela altura da vida. Logo quando resolvo me levantar e lutar, recebo um golpe tão duro! Minha alma sangrava.

Se lembra da menina que queria emagrecer a qualquer custo? Pois bem, ela conseguiu finalmente ficar magra. Emagreci tanto que minhas roupas caíam de meu corpo. Fiquei irreconhecível. Meus ossos apareciam debaixo de minha pele, coisa que nunca havia acontecido antes (quem sempre foi obeso sabe como é isso). Fui ficando cada vez mais fraca, sentia a vida deixando o meu corpo aos poucos. Eu não queria mais lutar, não queria mais viver. Estava cansada de tudo. Meus pais, preocupados, já não sabiam mais o que fazer. Me lembro de minha mãe sentada ao lado de minha cama, segurando uma de minhas mãos e dizendo "Filha, isso vai passar! Vai passar! Tenha fé."


quinta-feira, 26 de março de 2015

O renascimento

A minha situação era a seguinte: eu estava com pouco mais de 19 anos, passando pelo momento mais difícil de minha vida. Nunca estive tão magra, mas o peso já não tinha a menor importância pra mim. Eu queria a minha vida de volta.

Este blog tem sido escrito pra que eu compartilhe minhas dificuldades em relação ao peso e algumas mudanças que pretendo realizar na área da saúde. Mas não posso simplesmente deixar de contar uma das coisas mais importantes que aconteceram em meu processo de reabilitação.


Um pastor muito querido pela minha família, sabendo que eu não estava muito bem, veio me visitar. Ao vê-lo comecei a chorar muito, dizendo que ninguém fazia ideia do que eu estava passando, que eu estava completamente sozinha... Então ele me falou sobre o poder de Deus e de como Ele poderia me curar se quisesse. Naquele momento, chorando muito, eu disse ao pastor que não sabia se Deus existia, que havia ouvido e lido coisas demais a respeito de outras crenças, que havia trilhado um pouco o caminho do espiritualismo e esoterismo, ido a algumas palestras "new age", tido conhecimento a respeito de ovnis e tantas outras coisas. Minha cabeça já não aceitava mais explicações simples e nem a Bíblia como um livro sagrado, apenas como um livro de sabedoria.

Meu coração estava confuso. Dos 6 aos 16 anos eu realmente acreditei que existia um Deus que regia a minha vida. Mas a minha visão desse Deus, por mais que eu tivesse boa vontade, era um pouco embaçada pela minha falta de conhecimento.

Depois que eu me acalmei um pouco, o pastor tomou uma atitude ousada, que só quem tem absoluta certeza naquilo em que crê pode fazer. Ele me disse para que eu pedisse a Deus a coisa que eu mais queria naquele momento. Que se Ele quisesse, Ele me daria uma prova de sua existência, fazendo exatamente aquilo que pedi. Lembro-me que não acreditei que eu estava falando com alguém, achava que estava falando com as paredes. Mas falei. Disse a Deus que se Ele realmente existisse, que o que eu mais queria é que Ele me curasse da dependência.

Lembrando que eu estava no décimo sexto dia de um tratamento de desintoxicação que duraria no mínimo 3 meses. Naqueles anos todos eu tive muita dificuldade para dormir e quando conseguia, dormia de 2 a 5 horas por noite. Estava sempre cansada. Naquele dia eu somava exatos 4 dias sem dormir nem um pouco. Estava exausta, pálida, praticamente afundada na cama, tremendo, suando frio, sem esperanças, depressiva, chorando, zonza, esperando apenas a vida terminar. Tinha desistido de viver. Tudo aquilo era demais para mim, não queria mais lutar.

Mas eu falei com Ele. Pedi. E Ele me respondeu.


Naquela noite eu finalmente dormi. Sem dificuldade, sem insônias, sem pesadelos... simplesmente dormi. Ao acordar fui avisada pela minha mãe que eu dormi 18 horas seguidas. Meus tremores diminuíram drasticamente. Nos dias que se seguiram, minhas feridas começaram a literalmente desaparecer. Não sofreram o processo natural de cicatrização, elas foram sumindo rapidamente e não deixaram nenhuma marca em minha pele tão branca. Na semana seguinte eu consegui dormir 8 horas por dia, meus tremores haviam desaparecido, não suava mais, chorava muito pouco. Senti uma paz que há muitos anos não sentia.

Voltei ao médico que, totalmente surpreso, não acreditava naquilo que seu olhos viam. "Isso é impossível", ele repetia várias vezes. "Você fez o tratamento por muito pouco tempo, não é possível que você esteja tão bem, não houve tempo para que o seu corpo reagisse dessa forma". Fizemos alguns exames e então foi constatado que eu não tinha mais nenhuma substância em meu corpo. Nada. Nem anfetaminas, nem álcool, nem os medicamentos que estava tomando no tratamento. Foi como se alguém tivesse tirado tudo aquilo com a mão. Não foi psicológico. Foi real, extremamente e radicalmente normal.

Uma pausa para reflexão

Confesso que não tem sido muito agradável reviver aquela época de minha vida assim, com tantos detalhes. Imaginar que alguém está lendo estes posts é um tanto quanto constrangedor. Sempre que contei minha história para alguém, sempre foi de forma resumida, sem me ater a tantos detalhes. Mas reconheço esse momento como catalizador de emoções e de possíveis respostas a tudo o que tenho vivido nos últimos 20 anos em que olhei pra dentro de mim mesma e não entendi porque algumas coisas eram tão difíceis de se realizar. Hoje mesmo, conversando sobre este blog com o meu marido e citando algumas coisas aqui escritas, chegamos à algumas conclusões.


Não posso me considerar uma pessoa normal. 
Pelo menos não do ponto de vista da sociedade em geral. 

Pra começar, não consigo dormir cedo. Jamais. Se penso em dormir cedo, durmo às 2 da manhã. Normal pra mim é dormir entre as 3 e às 5 da madrugada. Normal pra mim é dormir de manhã. Então quando tenho compromissos no período da manhã, imagine o quanto me é difícil. Sim, vou lá e cumpro, mas sinto como se não estivesse lá. Por exemplo, se eu for pra alguma aula, preciso desenhar ou escrever. Se apenas ouvir, não ouço nada.

Não consigo ter rotinas ou disciplinas. De jeito nenhum. Tenho que me esforçar muito para cumprir algumas tarefas. Há anos venho tentando estipular tarefas e horários pré-determinados, mas nunca consigo cumprí-los. Não é questão de má vontade ou preguiça, simplesmente não consigo. Quando percebo já era, já foi, já passou. Isso porque tenho agenda, agenda telefônica, bilhetinhos na geladeira. Na época da faculdade sofri muito com isso. Quando trabalhava fora também. Cumprir horários e "bater cartão" é extremamente difícil pra mim. Tanto que a maneira que encontrei para continuar trabalhando foi ser autônoma, trabalhando em casa, fazendo os meus próprios horários.

Também tenho um problema bem sério de memória. Não a memória antiga, essa é ótima, me lembro com detalhes de coisas que até faço questão de esquecer. Mas a memória recente, esta está muito complicada... Esqueço tudo, a todo momento. Já não guardo mais nomes ou números. Há 3 meses estou morando em uma nova cidade e ainda não consegui decorar o número do telefone de casa. Também não consegui decorar o número do meu celular que tenho há 3 anos. Não consigo decorar o número de meu CPF que tenho há décadas... Demoro muito para decorar nomes de novos conhecidos. Não consigo me lembrar das coisas mais corriqueiras. Quer um exemplo? Desde que me casei eu esqueço de estender as roupas que lavo na máquina. Todos os dias. Nos dois últimos anos me esqueci do meu próprio aniversário. 


Nos últimos anos venho me esquecendo de conversas. Meu marido me pede algo, se eu não fizer imediatamente eu me esqueço de fazer. Várias coisas que ele me conta, se ele fizer alguma pergunta sobre o assunto depois de um tempo eu sinto como se ele nunca tivesse me contado nada. Antes de termos consciência do que estava acontecendo comigo, tínhamos algumas discussões a esse respeito pois ele entendia que eu simplesmente não prestava atenção e por isso não guardava as informações. Por mais que eu explicasse, ele me dizia "você precisa prestar mais atenção nas coisas". Hoje tudo é diferente. Ele percebeu que é algo muito mais sério. Fico muito constrangida cada vez que alguém me diz "mas eu te contei isso, você não se lembra?"... Não, eu não me lembro. E tenho me lembrado cada vez menos.

Uma coisa tem me assustado. O meu pai está com a doença de Alzhaimer e sei que é genético. Algumas tias também tiveram. Ontem, ao escrever sobre as lesões irreversíveis que as anfetaminas ocasionaram ao meu cérebro, pensei em minha situação atual.  No problema de memória, na falta de concentração, na dificuldade em criar rotinas, na dificuldade em dormir.Tudo me leva a crer que estou caminhando a passos largos em direção ao Alzhaimer. Isso me preocupa, mas preciso viver o dia de hoje. E hoje, o que tenho, é a vontade de lutar.